Em audiência pública dos servidores municipais, coordenadora da
Auditoria Cidadã da Dívida afirmou que governo tem uma clara estratégia de
transferência de renda pública para o setor financeiro
Escrito por: Confetam •
Publicado em: 12/07/2016, adaptado por José Carlos Santos Rodrigues
Faltaram assentos para
acomodar a quantidade de servidores municipais de todo o Brasil que foram à
Brasília, na manhã desta terça-feira (12/07), participar da audiência pública
sobre "O mundo do trabalho: desemprego, aposentadoria e discriminação, com
foco na justiça fiscal". Para não não perder o debate, promovido pela
Comissão de Direitos Humanos do Senado, os trabalhadores chegaram a organizar
uma fila na entrada do auditório, o que motivou o senador Paulo Paim (PT/RS),
presidente da comissão, a pedir que funcionários da Casa providenciassem mais
cadeiras.
Vieram representações de
muitos estados do país e de diversas esferas do serviço público, principalmente
do ramo municipal, como, por exemplo, da FETAMCE (Ceará), FETRAM (Maranhão),
FETAM (Paraná). Do Maranhão, participou o secretário geral da Federação, José
Carlos. O diretor do Maranhão, ao fazer uso da fala, destacou a boa aplicação
dos recursos públicos e a eficácia do serviço público nos municípios brasileiros,
onde, de fato, as políticas públicas são executadas. Nesse sentido, o problema
consiste no desvio dos recursos e não na falta destes.
Sucesso de público, a
audiência também foi vitoriosa em conteúdo. Coordenadora Nacional da Auditoria
Cidadã da Dívida, Maria Lúcia Fattorelli fez uma explanação sobre a relação da
dívida pública brasileira com os diversos projetos que tramitam no Congresso
Nacional com o objetivo de privatizar e reduzir direitos sociais, previdenciários
e trabalhistas.
"A desculpa para
aprovar o PL 257 é assegurar a manutenção da estabilidade econômica, o
crescimento econômico e a sustentabilidade da dívida pública. Então, quem ainda
não tinha percebido a relação desses projetos, inclusive da PEC 241, com a
dívida é só ver a exposição de motivos das propostas. Tá lá", afirmou.
Fattorelli explicou que o objetivo do governo ao defender os dois projetos é,
respectivamente, limitar gastos com os servidores públicos e com investimentos
em saúde para canalizar estes recursos para o sistema da dívida.
A lógica do Robin Hood
às avessas - de tirar dos pobres para dar aos ricos - justificaria o fato de o
Brasil ser hoje a nona maior economia do mundo, a terceira maior reserva de
petróleo do planeta, ter a maior reserva de água potável da Terra e a maior
área agriculturável entre todos os países do globo terrestre e,
contraditoriamente, ter 23,4% de sua população economicamente ativa vivendo com
menos e um salário mínimo.
Cenário
de escassez se muda com luta
"Eu vou lhe dizer:
tem de ser muito incompetente para fazer com que um país com toda essa riqueza
ainda tenha de lutar contra o desemprego e a miséria. Nossa realidade é de
abundância, mas nosso cenário é de escassez. Mas cenário a gente rasga, a gente
muda com a luta. E é por isso que estamos aqui", disse.
Para ilustar o paradoxo
no qual um país rico está submerso em uma crise econômica, política, social e
ética, a coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida citou o exemplo das
instituições financeiras do Brasil. Apesar de um contexto econômico
aparentemente desfavorável, Maria Lúcia Fattorelli lembra que, no ano passado,
os bancos tiveram lucros "escandalosos".
"Em 2015, o lucro
dos bancos aumentaram em mais de 20% em relação a 2014. Mas se toda a economia
real caiu, de onde vem o crescimento do lucro dos bancos? Não existe mágica. É
evidente que está havendo uma estratégia de transferência de renda para este
setor e quem promove essa engrenagem é o sistema da dívida", enfatizou.
Fattorelli destacou que
a conta do déficit público, estimado pelo desgoverno de Michel Temer em R$ 170
bilhões, é "fictícia". "Quando colocamos lado a lado todas as
receitas e despesas federais de 2015, comparando os regimes de caixa, chegamos
a conclusão de que não existe déficit. Em 2015, sobraram R$ 480 bilhões, quase
meio trilhão. Onde foi parar esse dinheiro?", questionou.
Origem
da desigualdade
Como origem da
desigualdade de renda, ela apontou o modelo tributário brasileiro, definido com
um dos mais injustos do mundo não só pelo fato de os impostos serem cobrados
diretamente sobre o consumo - quando o justo seria incidir majoritariamente
sobre a renda, o patrimônio, as heranças, os latinfúndios, os lucros
exorbitantes e as grandes fortunas -, mas principalmente por não combater e até
incentivar a sonegação fiscal.
"A carga tributária
de 34% não é para todos. Para os trabalhadores, é muito maior. Um servidor
público que ganha R$ 4 mil paga 27,5% de imposto de renda, mais 11% de
Previdência. Só na fonte, ele já paga quase 40%, e ainda paga todos os tributos
indiretos. Se tem carro, paga IPVA. Se tem casa, paga IPTU. Paga ICMS embutido
no preço de tudo o que consome, paga Cofins. O miserável que compra um pacote
de macarrão paga o mesmo tributo que um milionário", compara.
Representando a
Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Municipal (Confetam/CUT) na
mesa de debates, a secretária-geral da entidade, Jucélia Vargas, apontou a luta
pela justiça fiscal como prioritária. "Este é um tema que, mais do que
nunca, nós dirigentes sindicais temos de nos apropriar. Esse debate tem de
estar colocado na ordem do dia. Não é possível que, com tanta desigualdade, nós
servidores ainda levemos a culpa como se fôssemos responsáveis pelas dívidas
dos municípios e dos estados, enquanto observamos uma sonegação tão grande,
facilitada pela própria legislação", criticou.
O
exemplo da Confetam
Ela informou que a
justiça fiscal foi escolhida como tema da Campanha Salarial 2016 dos Servidores
Públicos Municipais e destacou que o debate pautou todas as mesas de negociação
da categoria com os prefeitos em todo o Brasil. Jucélia enfatizou ainda que uma
das principais bandeiras de luta da Confetam atualmente é a Reforma
Tributária.
Para ela, o movimento
sindical, principalmente do setor público, precisa colocar a justiça fiscal na
ordem do dia como uma maneira de pressionar o governo a repensar uma forma
justa de tributação. "Eu deixo aqui o exemplo da Confetam, para que outras
entidades realizem suas campanhas salariais a partir deste debate porque sem
justiça fiscal não há desenvolvimento social", concluiu.
Também integraram a mesa
de debates da audiência pública a secretária nacional de Relações do Trabalho
da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Graça Costa, e o diretor da
Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Pedro
Armengol, secretário adjunto de Relações do Trabalho da CUT.
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